As mulheres são maioria entre os brasileiros com dívidas em atraso, consequência direta da recuperação mais lenta do mercado de trabalho para elas.
Oito em cada dez brasileiras estão endividadas, mostra pesquisa
O percentual de brasileiros com dívidas em atraso é o maior em 12 anos, e a situação é mais grave para as mulheres.
O endividamento tem o rosto da massoteraputa Aline Gomes, chefe de família, mãe de uma menina de 6 anos: “Eu acabei deixando algumas contas para não deixar faltar o alimento em casa para minha filha, para minha família.”
E também tem a cara da dona de casa Fernanda Leite Pires, casada, três filhos: “Para não passar necessidade, a gente se endivida. Para poder fazer, ter as coisas em casa. Você vai pagar uma dívida, aí quando você termina de pagar essa dívida, você tem que pagar outra.”
As mulheres são maioria entre os brasileiros endividados. Segundo uma pesquisa da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo, no mês passado, 80% das consumidoras tinham contas a vencer. Em janeiro, eram 72%.
E pior: nem todas conseguem pagar, diz a economista da CNC, Izis Ferreira.
“A inadimplência também é maior entre o público feminino. Nós temos, por exemplo, 31% de mulheres hoje com algum tipo de dívida ou conta atrasada, enquanto entre o público masculino essa proporção ela se aproxima de 28%. Isso mostra que para elas está mais difícil de fechar todas as contas no mês, de conseguir pagar todas as contas e dívidas dentro de um mês”, afirma.
Na casa de Fernanda, faz tempo que o mês fecha no vermelho. Ela e o marido ficaram desempregados no início da pandemia. Ele arrumou outro emprego faz um ano; ela ainda não. Um retrato de como se dá a recuperação do mercado de trabalho, mais lenta para as mulheres. Sem renda, Fernanda ainda não conseguiu limpar o próprio nome.
“Não é só o alimento, porque a gente também precisa de bastante coisa. Lá em casa são três crianças, então precisa de um chinelo, cortar o cabelo, comprar uma roupa. A gente vai pegando o cartão emprestado, né? A gente depende do cartão dos outros”, conta.
As contas saem dos eixos quando há um desequilíbrio entre o que entra e o que sai no orçamento de casa. No caso das mulheres, a pressão vem dos dois lados. A pandemia aprofundou as desigualdades, colocou muitas na informalidade e fez a renda cair. Ao mesmo tempo, a inflação alta é ainda mais cruel com quem ganha menos. O resultado disso é um endividamento crescente, que não é bom para ninguém.
A economista do Insper Juliana Inhasz explica que dívidas que se arrastam ou sequer são pagas travam a economia.
“O que faz muitas vezes uma economia como a nossa conseguir crescer e sair de situações como essa atual é o consumo, é a demanda. Então uma situação em que a gente tem um superendividamento, ou muita gente inadimplente, é uma situação em que esse consumidor perde uma parte da possibilidade de consumo, ele eventualmente pode estar de alguma forma prejudicando produtores e outras pessoas dentro do mercado que cederam aquele crédito e que não vão receber, e que, portanto, também não vão consumir”, explica.
Aline está sem crédito na praça, mas trabalhando para resolver o problema: “Eu tive que usar um cartão de crédito e liguei hoje mesmo para tentar negociar. Para a gente, o nosso nome é tudo, né? O nome tem que estar limpo para gente conseguir os nossos objetivos”, diz.
FONTE G1