Os índices de cobertura vacinal da gripe no Brasil estão baixos, apenas 46,3% do público-alvo foi vacinado. Agora, a população em geral pode se imunizar nos postos de saúde. Os cientistas da Universidade de Miami descobriram mais um motivo para não deixar de lado essa imunização: a proteção contra o vírus Influenza reduz o risco de derrame, sepse (infecção generalizada), internação em UTI (unidade de terapia internsiva) e trombose venosa profundo em pacientes infectados com a covid-19.
O estudo, apresentado no Congresso Europeu de Microbiologia Clínica e Doenças Infecciosas, foi feito com dois grupos de 37.377 pessoas de diversos lugares, como Estados Unidos, Reino Unido, Alemanha, Itália, Israel e Cingapura. Um grupo foi vacinado contra a gripe de duas semanas a seis meses antes de ser diagnosticado com covid-19, e o segundo não recebeu imunização.
Os dois grupos foram acompanhados por fatores que poderiam afetar o risco de covid-19 grave, incluindo idade, sexo, etnia, tabagismo e comorbidades como diabetes, obesidade e doença pulmonar obstrutiva crônica.
Foi verificada a incidência de 15 efeitos adversos até 120 dias após o teste PCR positivo para covid-19. Os problemas analisados foram: sepse; derrames; trombose venosa profunda ou DVT; embolia pulmonar; insuficiência respiratória aguda; síndrome do desconforto respiratório agudo; dor articular; insuficiência renal; anorexia; ataque cardíaco; pneumonia; visitas de emergência; internação hospitalar; admissão na UTI; e morte.
As análises concluíram que os indivíduos sem vacinas contra a gripe tiveram 20% mais de chances de ficarem em estado grave da covid e precisar de atendimento em UTI.
Além disso, os não-imunizados tiveram 58% mais de probabilidade de precisarem de pronto-atendimento; 58% mais chance de sofrer um AVC; 45% mais possibilidade de desenvolver sepse e 40% mais de apresentar uma trombose venosa profunda.
O ensaio deixou claro, ainda, que a proteção contra o influenza não diminui os riscos de morte por covid-19 e uma vacina não substitui a outra. Os cientistas concluíram que as duas imunizações são importantes.
Os autores do estudo dizem que são necessárias mais pesquisas para provar e entender melhor o possível vínculo. Porém, no futuro, a vacina contra a gripe pode ser usada para ajudar na proteção em países onde a vacina contra covid-19 está em falta.
“Apenas uma pequena fração do mundo foi totalmente vacinada contra a covid-19 até o momento e, com toda a devastação que ocorreu devido à pandemia, a comunidade global ainda precisa encontrar soluções para reduzir a morbidade e a mortalidade. Ter acesso a dados em tempo real de milhões de pacientes é uma poderosa ferramenta de pesquisa. Juntamente com perguntas importantes, permitiu que minha equipe observasse uma associação entre a vacina contra a gripe e a menor morbidade em pacientes covid-19”, explicou Devinder Singh, autor sênior do estudo e professor de cirurgia plástica na Faculdade de Medicina da Universidade de Miami Miller.
“Independentemente de diminuir efeitos adversos associados a covid-19, simplesmente ser capaz de conservar os recursos globais de saúde mantendo o número de casos de gripe sob controle é motivo suficiente para defender esforços contínuos para promover a vacinação contra a gripe”, acrescentou o médico no congresso online que a pesquisa foi apresentada
A Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos registrou 39.333 denúncias de violência contra idosos no país apenas no primeiro semestre deste ano. O número corresponde a 215 por dia e representa mais de 26% do total de relatos recebidos pelo Disque 100, Ligue 180 e aplicativos de Direitos Humanos. O montante pode ser até maior porque, na pandemia, as vítimas estão confinadas por mais tempo com os agressores.
“A partir de 2019, houve uma reformulação no Disque 100 e o aprimoramento das denúncias. Na comparação com 2020, houve aumento, mas isso não significa que todas são verídicas. A dificuldade é encaminhar o relato para o munícipio e ele ter como apurar. Às vezes, quando chega, já foi superada, por isso a importância da criação de uma rede de proteção mais rápida”, afirma Antonio Costa, secretário nacional de Promoção e Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa.
Segundo o relatório da Ouvidoria, em 6 meses, foram registradas 156.777 violações de Direitos Humanos: física, patrimonial, psíquica, de liberdade, entre outras. Em só uma denúncia, pode haver diferentes violações. A psíquica tem mais de 31 mil registros e a de integridade física, outros 30 mil.
Ao longo de 2020, foram quase 88 mil registros de violência contra pessoas idosas, ainda de acordo com a Ouvidoria, ficando atrás apenas de violência contra mulher (105 mil) e contra crianças e adolescentes (95 mil).
A violência psicológica é uma das formas mais comuns e é caracterizada por constrangimento, humilhação, tortura, ameaça ou coação. Ela prejudica a autoestima do idoso e pode desencadear depressão e outros distúrbios nervosos. A quarentena pode até ter agravado o cenário.
“Mais de 80% dos casos acontecem nas residências. A maioria é negligência, pela ausência de uma ação. Na pandemia, o idoso está isolado, não tem apoio da rede social, às vezes não tem alimento adequado e nem atendimento médico. Há um aumento contínuo do número de casos ao longo dos anos”, destaca Simone Fiebrantz Pinto, que é presidente do Departamento de Gerontologia da SBGG (Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia).
Vivendo na pele
Identificar a violência nem sempre é fácil, ainda mais quando ocorre dentro das casas. De acordo com o relatório da Ouvidoria, em quase 21 mil denúncias a violação aconteceu na casa da vítima e também do suspeito.
Os agressores são, na grande maioria, filhos e filhas responsáveis por cuidar dos pais (13.125 registros). Mas há também casos de cônjuges, cuidadores profissionais e familiares.
Maioria dos agressores são filhos ou filhas dos idosos ou netos
Algumas das dicas para identificar que o idoso não está bem são: observar o comportamento dele, se houve mudança na rotina, até mesmo ida à padaria ou passear com o cachorro, se está acuado, isolado, com medo de falar, se desvia o olhar quando está acompanhado por familiares e até a presença de hematomas.
“O primeiro responsável por cuidar do idoso é a família, o segundo, a comunidade e, em terceiro, o estado. Às vezes é um porteiro que nota ou um atendente. O emagrecimento pode indicar que ele está com depressão por conta das agressões sofridas. Quando pensamos em maus-tratos vem a questão física, que é a mais vísivel. Mas a maior é a psicológica”, explica a presidente de gerontologia da SBGG.
A maioria das vítimas na terceira idade são mulheres, mas as idades variam bastante. Das denúncias recebidas, 6.861 eram de pessoas entre 70 e 74 anos.
Gráfico mostra a idade das vítimas denunciadas em relatório da Ouvidoria
Uma assistente social, que atua desde 2011 em postos de saúde da zona leste de São Paulo e prefere não ser identificada, contou ao R7 que já presenciou muitos casos de denúncias, mas faz uma ressalva: “Sempre tem que analisar para conhecer melhor aquela família, o que está nas entrelinhas. É um trabalho em rede, de formiguinha. Todos temos uma história e precisamos ir a fundo”.
A profissional já foi até ameaçada de morte pelo filho de uma idosa, que era usuário de drogas: “Me olhou e disse ‘vou te matar’, que era para eu tomar cuidado. Eu respondia que não tinha medo dele. Agredia a mãe, tinha medida protetiva, mas, por ser filho, ela o deixava entrar”.
Importância das denúncias
Ela se sente triste ao ver os parentes discutindo na frente do idoso. “O que mais dói é quando a gente vê os filhos brigando para não cuidar dos pais, acamados, sem qualquer constrangimento. E o pai ou mãe ouvindo tudo, escorre até lágrima e pensam: ‘sou um fardo'”, revela.
A assistente social coleciona histórias que nem sempre têm final feliz. “Tinha uma idosa que não podia ficar sozinha e a filha disse: ‘por que tenho que cuidar dela se ela nunca cuidou de mim? Faço papel de mãe desde os 7 anos’. Ou uma senhora que tinha um relacionamento com um jovem, que era bancado por ela. Chegou toda machucada no posto e se negou a fazer o B.O”, lembra.
A violência contra os idosos pode ser denunciada pelo Disque 100, em delegacias, pelo 190, ao Ministério Público, SAMU (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência), aplicativos de Direitos Humanos e pelo WhatsApp (61) 99656-5008. A identidade do denunciante não será revelada.
Segundo a assistente social, as visitas domiciliares dos agentes de saúde são essenciais para o estudo de caso, verificação da rotina, da aparência dos idosos, para entender o motivo das faltas nas consultas, se estão com a higiene em dia, entre outros fatores.
“Por estar mais tempo juntos em casa na pandemia, a violência fica mais nítida. As pessoas têm medo de denunciar, mas confiam nos agentes comunitários de saúde e relatam. Mas, muitas vezes, não querem ir para a delegacia para não prejudicar o filho ou parente”, explica a assistente social.
Nem sempre a violência deixa marcas nos idosos, mas há casos com hematomas
De acordo com a médica Simone Pinto, na consulta é possível verificar sinais de maus-tratos. “Médicos podem ver se há desnutrição, fraturas, hematomas. Fazer uma avaliação física do cabelo, dentes, notar sinais de negligência. Sempre se direcionar ao idoso e notar se o familiar interfere na fala, qual o tom de voz. Os olhares dos pacientes dão dicas”, alerta.
Para notar os sinais de violência, nem sempre aparentes, é preciso que todos estejam preparados e atentos. Os vizinhos, amigos e a comunidade também fazem parte da rede de proteção. A saúde do idoso é problema de todos.
A violência contra o idoso é crime e a pena pode chegar a um ano de reclusão, além de multa.
Deficiências
Até mesmo a surdez pode ser um gatilho para a violência doméstica. “Estamos todos confinados e o cuidador tem que repetir várias vezes o que diz, isso leva ao esgotamento mental, ao estresse com a repetição. Isso gera xingamentos, exclui o idoso da cena e, às vezes, gera violência física”, ressalta a presidente de gerontologia da SBGG.
Nestes casos, a prótese auditiva é a solução, mas há também dificuldades de adaptação ao aparelho, com necessidade de idas constantes ao fonoaudiólogo. No entanto, uma vez adaptados, os idosos ganham autonomia.
Outros tipos de deficiências, como visual e motora, acarretam em dependência total do idoso ao cuidador familiar ou profissional. “Em quase 50% dos casos os agressores são os filhos e, em 10%, os netos. Em muitos, não há divisão de tarefas e o cuidador fica sobrecarregado. Isso é um fator de risco para a agressão. É preciso cuidar também de quem está cuidando”, diz a especialista.
Mas nem todo idoso tem um temperamento fácil de lidar e aceita ajuda externa. Muitos refletem a violência sofrida, questões do passado e precisam antes fortalecer os vínculos familiares.
“A violência é complexa, multifacetada. Uma senhora relatou que sofria violência por parte da filha, chegou toda roxa. Houve uma investigação do caso e descobrimos que era agressão mútua. Ela batia na filha, que revidava. Em outro caso, a idosa tem dificuldade de andar, mas é geniosa e afasta as pessoas. Sempre que recebe ajuda, pede para a pessoa não ir mais porque não fez as coisas do jeito dela”, conta a assistente social.
Para entender a violência, segundo os especialistas, é preciso investigar a origem do problema. Muitas vezes a agressão é apenas a ponta do iceberg.